Wednesday, August 27, 2014

CONSIDERAÇÕES SOBRE A INVEJA

Não, não se trata de correr em busca do sal grosso, de carrancas e patuás. Ainda que a inveja possa ser tratada de forma doméstica - como uma dor-de-cotovelo entre amigas, o aborrecimento por atributos que um colega de trabalho ou até um desconhecido que tenha projeção na mídia possuam em detrimento de seus próprios, o carro luxuoso que você não pode ter ou um simples sorvete maior que o outro, ela é sem dúvida perigosa.
A inveja transtorna e causa doenças para aqueles que ficam ruminando suas decepções e tristezas. Mas se o "olho gordo" é tratado popularmente de maneira até folclórica e bem humorada, esse tipo de sentimento pode ser considerado a própria origem do mal.
A inveja é menosprezada em sua nocividade. Causa mais estragos do que poderíamos supor. Provavelmente ela se esconde, quietinha e camuflada, nos bastidores de todas as grandes desgraças da humanidade.
Exagêro? Não exatamente. Veja só o caso de Caim e Abel... os mais céticos devem reconhecer que não há como negar a antiguidade da inveja, tampouco a sua realidade, mesmo abominando o registro bíblico.
Ela ( a inveja) está onipresente nas grandes guerras, nas revoluções, no sadismo da humanidade. Calígula era extremamente invejoso e isso norteava a sua crueldade. Poder e inveja formam um coquetel desastroso. Hitler era frustrado pela sua falta de talento, tanto que imaginou um mundo onde toda a arte existente estaria sob sua guarda. De preferência acabando com os autores, porque a inveja admira o talento, mas não pode perdoa-lo.
A inveja é amiguinha da mediocridade. Vivem de mãos dadas, suportando-se mutuamente, mas tentando unir-se para destruir o objeto de sua ira. É, porque a inveja se esconde também sob a ira, esse sentimento odiento que faz o sujeito cuspir a maldade. A dramaticidade aqui é importante para definir a balbúrdia criada na humanidade por esse sentimento inerente, que habita a alma humana como um protozoário potencial, ou um defeito natural em hibernação - se não for vigiado acaba ganhando espaço.
No final das contas a única alternativa para evitar que a inveja faça seus estragos é cultivando o próprio talento. Uma espécie de "vacina" contra esse mal, que permite uma vida menos espremida e perigosa, dolorosamente competitiva e regida pela moral e valores supérfluos que pretendem controlar o mundo da mesma maneira que se controla o gado no pasto.
Se a virtude depende de disposição para para criar e construir, a inveja também depende da decisão de não permitir o artificialismo do poder. De alguma forma é preciso quebrar o círculo vicioso que impõe a agressividade na conquista de um espaço através da eliminação do objeto da inveja, que afinal pode ser sublimada, como todo e qualquer sentimento, individual ou políticamente no espaço coletivo. (Mirna Monteiro

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