"É o fim do mundo!", repetia uma senhora que aguardava atendimento em um pronto-socorro de um hospital particular. Entre tantas coisas absurdas a pior delas certamente era o fato do desleixo e da falta de ética ter atingido uma área extremamente delicada, a da saúde. "Como é que eu vou saber se estou sendo tratada ou destratada?" perguntou ela, em meio ao desabafo.
Boa pergunta! Mas a resposta é impossível! Como saber até que ponto a nossa evolução social e tecnológica não se transforma em armadilha?
A ciência avança hoje a níveis surpreendentes. Mais alguns anos, dizem, e a velhice será coisa do passado, a morte será adiada em décadas e as doenças serão vencidas com a regeneração celular!
Que maravilha! Ninguém duvida disso. O problema é outro! Paralelamente à evolução científica e tecnológica, outro extremo da realidade não pode ser vencido: o desgaste da sociedade e de seus valores, o aumento da mediocridade profissional e do objetivo do capital em detrimento do fator humano!
Quem pode com isso? Trocando em miúdos, podemos afirmar que o que temos hoje, em um momento de grandes recursos da medicina, é uma péssima medicina! Afinal ainda não podemos trocar a figura do médico por robôs irrepreensíveis. Ainda dependemos do fator humano para cuidar do fator humano. É a principal razão da existência humana, manter a sua espécie!
Aparentemente o grande desafio da medicina hoje são os próprios médicos. Os mais recentes, despreparados, oriundos de universidades que não conseguem formar adequadamente o cidadão, mesmo cobrando altíssimas mensalidades. Os recém-formados, atraídos para a área por questões econômicas (ser médico "dá dinheiro", mesmo que seja impossível avaliar a vida em trocados...) encontram um mercado tão saturado, que a estrutura de qualificação do médico fica comprometida: não há hospitais suficientes para formar residentes.
E sem residência, que é a prática, é quase impossível completar o ensinamento básico do profissional de medicina!
E os mais antigos? Talvez com alguma experiência, mas completamente entregues à massificação do sistema. O paciente é visto cada vez mais como um objeto a ser descartado o mais rapidamente possível. Tempo é dinheiro! As consultas hoje são velozes e extremamente curtas. Nos consultórios particulares, a peso de ouro, é possível mais tempo. Mas na base dos convênios médicos, planos de saúde que aplicam a filosofia da quantidade em detrimento da qualidade, a consulta é de até dez minutos em média.
O tempo suficiente para um médico perguntar qual é o problema e passar a lista de exames. Sem a biomedicina, a medicina hoje não é nada. Mas isso não elimina ainda o risco de enganos causados pelo cansaço ou incompetência na interpretação dos exames ou no tratamento da patologia!
É mesmo o fim do mundo! Ou pelo menos o fim da crença de que a medicina é sempre heroica e acima de qualquer suspeita.
É possível entender o desabafo dos pacientes! E este é um problema que preocupa a todos, inclusive aos médicos, que afinal também são pacientes em algum momento da vida!
Exigir capacitação profissional é o único recurso para evitar o caos, em uma sociedade onde sobram profissionais formados em medicina, mas faltam médicos! Onde está a figura o médico, que por vocação interagia com o paciente e fazia milagres em épocas onde não havia qualquer tecnologia?
É possível haver exercício da medicina sem a filosofia que norteia essa responsabilidade?
É bom pensar sobre o assunto... (MM)